Perfume Genius (Mike Hadreas)
Algo simples e forte me impede auto-piedade. Não desejo voltar a tempos chuvosos, mas quando parei para começar a contagem, já se tinham ido 25 anos. E ainda se espera algo: um amor, uma casa, um nome... Entretanto, longe de muitos ouvidos, há uma teoria ágrafa e uma experiência silenciosa que me tomam as mãos. Descrevê-las-ia? Pudesse. Mas não.
Não.
Não.
Porque minha existência, embora sempre que possível ter recheio de morangos, cruzar a parada de fanfarras, dormir extasiada, etc., é determinada por falta e espera. A espera existe pelo gesto ceifado, pelo olhar desviado, pela palavra-ricochete. A falta, pelas fugas. E pelas lutas.
Porque minha existência, embora sempre que possível esta moça de sombrinha num campo de lavandas, este desfile de haute couture, esta espirituosidade característica, etc., é levada a C-R-E-R na febre e dor de cabeça de um achado importante mesmo à minha sobrevivência [aqui metade da espera se vai, mas não tem muito haver com ser feliz].
Porque minha existência, embora sempre que possível blindada pela luz da tarde, cozida com legumes diversos, perfume guardado na camisa daquele cara, etc., conduz majestosamente minha cabeça à C-R-E-N-Ç-A de que nada de errado há comigo ou por aqui, e é natural me verem inofensivo, competente, sorridente, aceito.
Mas não.
Não.
Não.
Pelo menos pela segunda vez na vida, C-R-E-I-O me ser direito a paranoia. Minha cabeça majestosa: querem-na. Meu achado: esquecido. Minha fanfarra: ossos humanos fundidos aos metais ferventes.
Pelo menos pela segunda vez na vida, C-R-E-I-O me ser necessário recordar que a vida e o corpo que se destinam ao amor e ao prazer se conhecem tarde, e sem perspectiva de volta. E que não tenho direito a errar por paixões legítimas porque fui/sou um ser que escolheu analisar, silenciar, sufocar ¾ da busca por felicidade pelos métodos conhecidos. Contudo, esta foi uma ÚNICA E-S-C-O-L-H-A ÚNICA.
Pelo menos pela segunda vez na vida, C-R-E-I-O que as respostas não estão na fuga ou na espera. Mas sou livre como uma testemunha que mudou de cidade. Logo quase toda a maior parte do dilema voltará à fuga & espera.
***
A noite e suas cavernas me esperam em suas negações, fingimentos, esperanças inauditas dentro dos corpos sinuosamente grafados em dance music. Ciente do lado b da existência [diria o amigo Bioque Mesito] permanecerei cunhando um caminho para o líquido mais adequado às expectativas do momento.
‘Carpe diem’.
‘Carpe noctem’.
‘a poupança ainda é o melhor investimento para a classe média’.
***
Mas não me esquecer no tempo de areia, não esquecer o amor que me peço e navega nalguma garrafa, não esquecer o sofrimento em drágeas que a verdade insiste oferecer.
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