sábado, 25 de agosto de 2012

amantes



Every kind of love, or at least my kind of love 
Must be an imaginary love to start with
                                                                              Rufus Wainwright


Certas vezes, quando mal se percebe a presença do dia e mal se consegue esquecer da noite, compreendo porque me são negadas certas respostas do futuro: preciso manter alegrias polidas, compromissos silenciosos, distrações eficientes, a fim de condescender aos apelos de felicidade tatuados em minha existência pela história física de homens, mulheres e placas tectônicas.

Presenciasse que, [somente no limite de duas mãos em concha], cabe o que sei do outro e quanto de meu futuro é guardado a ele, me faria escravo de qualquer mal; porém, das lágrimas que viessem, das ânsias que se construíssem, fato de preocupação seria, ao abrir da concha de mãos em desespero, fazer cair o que sei e não sei de mim: me perderia núcleos, seria um pensamento dissolvido num oceano duma pedra gravitando no escuro.

Desse outro que espero sem compromisso, desse outro que vejo noutros, espero que me toque as mãos, fechando-as, beijando-as. Me arrastasse a uma praia, necessitado de algo meu que o prolongasse no Tempo, e no que sobrar de Espaço, adorar meu silêncio ameaçando acordar.

A necessidade pelo outro se explica mesmo em olhar-se no espelho. Queremos o ou[t]ro de tudo, a juventude é feita de ânsias imemoriais, magnéticas.

Mesmo na espera, observando o pular dum pássaro de praça, DESEJO, busco através de radiação cósmica de fundo, Aquele, O Cara, O Outro.  


sexta-feira, 10 de agosto de 2012

I=∆P



I can't see the future
But I know it's watching me


Dias permanecem. 
Permanecem correntes (como rios? como elos?)?. 
Dias e suas partes, correntes em correntes 
— coar café; equilibrar-se no ônibus; fatiar cebolas; 
torcer, chorar, querer, esquecer pela televisão; 
suar durante o sono. 

Dias como correntes: 
cordas bambas? Cadeados? 
Orações?

Dias. 
Finjo prevê-los num sol mal acordado, ou mesmo no rosto estranho que encontrei na calota de um carro: obsessão secreta por unir sinais sem utilidade, para que não digam nada quando algo grande de fato acontecer. E não aconteceu ainda porque não quero, ou não posso. Ou porque me fará fugir mais uma vez do senso de controle. 

Mesmo que o futuro se torne um pacote a ser retirado do correio, os dias estarão lá, acorrentados a este pedaço que respira; ainda existirão os pressentimentos que, ainda que cientificados, não me convenceriam: me parece que revelações são possíveis, mas ainda tenho dúvida; e ao final de qualquer coisa, acreditarei em tudo.

Escolher algo para o futuro significa esperá-lo? Ainda que vá atrás, não o seria? E quando ele estourar em sangue, o que será? 

Espera. 

Espera por mais futuro. E com as vísceras enlaçadas ao sono cada vez mais curto da luz do dia, permaneço fingindo que prevejo o futuro. Mesmo buscando-o. Ou esperando-o. Ou vivendo-o.



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gaveta, galáxia by Sebastião Ribeiro is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Não a obras derivadas 3.0 Unported License.