terça-feira, 25 de dezembro de 2012

fuga & espera





Perfume Genius (Mike Hadreas)


Algo simples e forte me impede auto-piedade. Não desejo voltar a tempos chuvosos, mas quando parei para começar a contagem, já se tinham ido 25 anos. E ainda se espera algo: um amor, uma casa, um nome... Entretanto, longe de muitos ouvidos, há uma teoria ágrafa e uma experiência silenciosa que me tomam as mãos. Descrevê-las-ia? Pudesse. Mas não. 

Não.

Não.   

Porque minha existência, embora sempre que possível ter recheio de morangos, cruzar a parada de fanfarras, dormir extasiada, etc., é determinada por falta e espera. A espera existe pelo gesto ceifado, pelo olhar desviado, pela palavra-ricochete. A falta, pelas fugas. E pelas lutas. 

Porque minha existência, embora sempre que possível esta moça de sombrinha num campo de lavandas, este desfile de haute couture, esta espirituosidade característica, etc., é levada a C-R-E-R na febre e dor de cabeça de um achado importante mesmo à minha sobrevivência [aqui metade da espera se vai, mas não tem muito haver com ser feliz].

Porque minha existência, embora sempre que possível blindada pela luz da tarde, cozida com legumes diversos, perfume guardado na camisa daquele cara, etc., conduz majestosamente minha cabeça à C-R-E-N-Ç-A de que nada de errado há comigo ou por aqui, e é natural me verem inofensivo, competente, sorridente, aceito. 

Mas não.

Não.

Não.

Pelo menos pela segunda vez na vida, C-R-E-I-O me ser direito a paranoia. Minha cabeça majestosa: querem-na. Meu achado: esquecido. Minha fanfarra: ossos humanos fundidos aos metais ferventes. 

Pelo menos pela segunda vez na vida, C-R-E-I-O me ser necessário recordar que a vida e o corpo que se destinam ao amor e ao prazer se conhecem tarde, e sem perspectiva de volta. E que não tenho direito a errar por paixões legítimas porque fui/sou um ser que escolheu analisar, silenciar, sufocar ¾ da busca por felicidade pelos métodos conhecidos. Contudo, esta foi uma ÚNICA E-S-C-O-L-H-A ÚNICA.

Pelo menos pela segunda vez na vida, C-R-E-I-O que as respostas não estão na fuga ou na espera. Mas sou livre como uma testemunha que mudou de cidade. Logo quase toda a maior parte do dilema voltará à fuga & espera. 

***


A noite e suas cavernas me esperam em suas negações, fingimentos, esperanças inauditas dentro dos corpos sinuosamente grafados em dance music. Ciente do lado b da existência [diria o amigo Bioque Mesito] permanecerei cunhando um caminho para o líquido mais adequado às expectativas do momento. 

‘Carpe diem’. 

‘Carpe noctem’.

‘a poupança ainda é o melhor investimento para a classe média’.


***

Mas não me esquecer no tempo de areia, não esquecer o amor que me peço e navega nalguma garrafa, não esquecer o sofrimento em drágeas que a verdade insiste oferecer.



sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

*




você é um mar equânime que pede uma coisa qualquer coisa além de paredes 

curioso é permanecer este mar cínico se debatendo num devaneio num espaço de um tempo que nunca te disse pra parar 

crianças morrem e comes hambúrguer 
alguém falou algo sobre um buraco negro?
e as grades daquela escola em ferrugem de 10 anos?
dancefloor

teu problema usa letras & silêncios olhares & gestos sons que fogem mas

ele é incomunicável
provável que não fale português

nem arpad miklos o manteria em seus braços

nem esteja aqui quando fotografarem a camada de teus sonhos diluídos no nife 



segunda-feira, 26 de novembro de 2012

dovetail


Só o que me explicaria agora seria o som de taças quebrando. 

Então, ele recolheria do chão um dos minúsculos pedaços de cristal, e o deslizaria em minha nuca [quero acreditar que é sua boca].

Em tal instante, como se tocasse meus próprios pés ou me sentisse jogado ao sono, não conseguiria negar que preciso encontrar maneira de acoplar nossos poros, visto que lhe quero até os invisíveis pelos louros escorrendo por seus braços. 

Desejo ser leve e simples o bastante para me conformar num casulo.

***

'Jesus, a vida toda esperei por isto? Qual carruagem me leva, que cavalo lhe é ideal?', respondo ao medo de abrir os olhos e assumir de que sonhos são feitos.

***

Passei [e se me conheço, passarei] tantas noites e dias paralisando o olhar naquela reflexão que busca a racionalidade dos gestos, tentando autocontrolar qualquer coisa, me defender de todo aquele arame farpado que creio estar em mim, 

mas

a sensação de vazante dentro do peito é imensa. Faz-me contar as horas, fugir de qualquer coisa construída, porque agora considero consumi(a)r algo, e levanto o pensamento aos céus pedindo ser dobrado como papel de carta antigo, ser guardado rosa num livro grosso, ser eu mesmo caminhando em eternas 16hs.

Eu quero o fogo.


domingo, 18 de novembro de 2012

por que sou insuportável



Digo bom-dia ao cobrador esperando a aposentadoria.
*
Sinto remorso.
*
Constantemente acho que algo não está bom o suficiente.
*
Tenho consciência da frustração.
*
Reconheço que algumas experiências em educação DEVEM ser traumáticas.
*
Não dou o peixe, ensino a pescar (e também reuso lugares comuns).
*
Cultivo uma moderada baixa auto-estima.
*
Reflito alguns conflitos em pornografia.
*
Sinto muita vontade de rasgar algumas coisas à faca, but I couldn't.
*
Conformo-me a esperar.
*
Sei-me enorme.
*
Guardo a certeza que sou do mundo.
*
Incomoda-me mentir desnecessariamente.
*
Tenho problemas com clichês

(e com esta frase, fecharei com chave de ouro).


segunda-feira, 22 de outubro de 2012

poemas em Macondo n° 6


Poemas inéditos na Macondo n° 6! Espero impressões de vocês. De qualquer forma, em breve escreverei sobre os partos que geraram os textos.

Enjoy it!


domingo, 14 de outubro de 2012

bula



Dias atrás, papeando com alguns amigos, coloquei-lhes a questão da auto-publicação, justificando logo após. Alguns levantaram a questão de financiamentos, etc, quando lhes disse que um dos fatores que vêm guiando minha escolha por este tipo de publicação é o valor. Até que uma amiga soltou algo como: 

— Sinto muito, mas se você quisesse publicar, já o tinha feito...

Levei [claro] na esportiva. Dias depois, refogando aquelas palavras, me recordei que, de fato, muitas vezes somos impelidos a tecer um comentário-outro à vida alheia, mesmo que com a quase-total consciência de, muitas vezes [muitas mesmo], não conhecermos a pessoa ou sua vida em suficiência para sermos justos nos julgamentos. 

Este post tem a missão principal de me tirar um fardo das costas, e a coleção de posts que pretendo criar com este rótulo, bula, sustenta o objetivo pessoal de desmi(s)tificar, num primeiro instante, minha[s] persona[ae] artística diante disto que nossa geração considera e entende 'mundo'. Para começarmos: minhas considerações sobre a auto-publicação.

***

Em mim, a auto-publicação surge de uma meditação quase constante sobre o criador, a criação e a disseminação [infecção?] do criado. Como uma pesquisa no Uncle Google pode indicar, é tão velha quanto biscoito de polvilho. Grandes nomes a buscaram. Hoje os meios de se auto-publicar mudaram, falemos do suporte clássico ou digital.

Minha necessidade por auto-publicar-me é consequência de uma história consideravelmente estafante; desta feita, lançarei mão da síntese-amiga sempre que possível. Há mais ou menos 10 anos comecei a 'rascunhar' algo que considerava poesia. Grandes possibilidades em minha vida, seja a nível pessoal ou compartilhável, só fizeram-se presentes há cerca de 5 anos. Neste ínterim  já carregava textos de qualidade e que considero particularmente relevantes, mas, óbvio, digo isto numa perspectiva que reúne possibilidades íntimas e de relação com a tradição deste belíssimo cofo chamado Maranhão [sem ironias, pfvr]. Mais detalhes do que tenho para auto-publicar, vide aqui e aqui.

A experiência que tive em Acorde foi preciosíssima, porém consumidora. A burocracia do papel [detalhes editoriais, boletos, cheques, correios, bonecos, contratos etc etc] levou um tempo importante. Especialmente porque falamos de poetas assalariados-cidadãos-pagadores-de-contas-de-luz-e-aluguel-fazedores-de-supermercado-etc-etc-etc. A burocracia do papel que cito, claro, é relativa: não condeno o suporte papel, ao contrário. É uma invenção duradoura, uma tecnologia adequada ao propósito, especialmente ao gênero poético. O burocrático aqui se refere ao alto custo que não visa lucro [sometimes], seja pelo gênero, pouco apreciado pelo público leitor-consumidor, seja pelo artista enformado no salário.

A regra é clara: poetas de hoje não publicam [ou se auto-] como há 100, 150 anos atrás. A magia dos tempos de nossos antecessores não contenta mesmo olhos comuns e surpreendíveis.

Em termos e tempos blogescos, sim, acredito no suporte digital. Ouviríamos " — Mas, Sebastião, nem todo mundo tem possibilidades de...". Óbvio, não sou tão alienado assim; só acredito que o futuro tecnológico existe. E também acredito que árvores só deveriam ser derrubadas para papel se a morte as valer [ou vender]. E principalmente, tendo em conta a recepção de poesia, inicialmente, numa cidade como esta, num estado como este, num país como este, com uma Educação [e disposição de mudar o futuro de milhões, sensíveis ou não ao gênero poético e artes em geral etc] como esta, o público disseminador da poesia torna-se especializadíssimo [eufemismo para mínimo e naturalmente seletivo].

Em nome da liberdade criativa e da condição a que os tempos modernos vêm condicionando nossa fisiologia, entendo a auto-publicação digital ou em papel um modo de democratizar a leitura e o que ela traz. Em defesa da sobrevivência e ramificação da Arte é que escrevo e penso nisto. Estamos num caminho irreversível, se tratando de tecnologia, mas que esperamos auxiliar na construção de uma mentalidade mais crítica da recepção, que migra para certas banalidades virtuais, sem sequer ter a oportunidade de enxergar vida inteligente neste mesmo meio virtual. Ah, e sem extremos: até onde puder, meios atuais de auto-publicação digital também disponibilizam a obra impressa, sobre demanda. Tudo isto tem mais a ver com democratização, e não radicalidade [whatever it means].

Encerrando este tiro no próprio pé [pela extensão deste post], desejo informar a quem quer que seja que, buscar alternativas realistas ao oferecimento da própria arte não pode passar por uma espécie de crime, como as grandes e/ou obtusas editoras desejam. Me chega uma forte impressão de que estamos, em vários níveis da existência, dando prioridade a subterfúgios. Sugerindo implicações e desenvolvimentos, não esqueçamos que ESTAMOS FALANDO DE ARTE, JESUS!

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

do a little living



Peculiar, acho, esta forma de relacionamento com as palavras em que certos vocábulos começam a correr de alguma coisa, e certos pedaços de léxicos se tornam tão presentes que induzem ao vômito. Então, se é apresentado ao receio de uma continuidade semi-indesejada, envolta em clichês  ou seja  re-entregue ao uso comum e corrente desta recepção também peculiar, chamada resto, noves fora eu.

Na verdade, o parágrafo acima poderia justificar boa parte da recorrência temática de meio-mundo, daqueles que se aventuram em ser periféricos de saída; na verdade, em espécie de fuga ou contentamento, invento justificações quase-vãs que ajudem a solidão em escrever, quase-convencido eu, de que palavras são de carne.

***
Enfim, acabei de me ouvir pedindo: 
– Espere mais um pouquinho...


segunda-feira, 24 de setembro de 2012

convenções



Colocasse Deus o segredo de tudo na boca de um homem, ainda não conseguiria medir-lhe uma verdade  sequer que me ajudasse a ser algo mais neste solstício; mais que um assalariado convencionadoperdidoexcitado.

Segredo que – se há numa forma que humanos reconhecemos – não se embalasse em palavras, visto que o desvirtuaríamos assim, formigas sob uma estrela G2 que somos.

Neste caminho, gostaria de saber o que guardaria sobre 'querer acima de uma convenção'.

Desta feita, não sei que é meu corpo. 

Qual sua relação com campos magnéticos. Quanto de flores residem-lhe em silêncios. Quanto do puma estoco em meu coração. Por que sinto o voo ininterrupto duma ave-do-paraíso em meu sono*.

*[Et coetera¹²³³²¹¹²³³²¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³³²¹¹²³]

...

Ele: os lábios não fazem sinais para que eu os espere. Os olhos comuns, magicamente não querem ser descritos além. E todo o resto me floresce numa languidez de doença tropical.

Eu: medo da busca. Espera. Esperança.

                                       ...

Eu: segredo. Convencionado. Perdido. Excitado.





quinta-feira, 13 de setembro de 2012

rotação


Me pergunto se me veem através da expressão fechada, dos silêncios inesperados, das distâncias provocadas. Jurava que me escondia sob um manto verde-esmeralda; há quem não o veja; há quem o considere invisível.

Me pergunto quanto de viver não será preparação ou ante-alguma coisa que nos proteja de nós mesmos, quando nos ligar aquele que nos quer como somos (soulmate? best friend forever? Jesus?). Me pergunto, mas fixando alguma coisa de mim em teu rosto, como se estivesse te perguntando algo.

Chego a concluir por nosso bem que devemos nos esconder com frequência, frequentar um ao outro com parcimônia, vender parte de nossa sinceridade ao coletivo. Porque logo, logo saberemos que nunca fui uma crisálida verde-esmeralda e que você nunca entendeu bem o que dizia.

Em breve, acenderemos uma chama, chamaremos um ao outro para entrar, conversaremos sobre o processo que sempre nos coloca aqui, no hoje.

Daqui a alguns meses, voltarei a achar-me numa armadura transparente, e você, continuará a pensar que estou mudado.


terça-feira, 11 de setembro de 2012

torn between bitterness and hope


I know you are reading this poem listening for something, torn
between bitterness and hope
turning back once again to the task you cannot refuse.

                                                                                                                                             (Adrienne Rich, 
from Poem "XIII (Dedications)"
from An Atlas of the Difficult World (1991)
Adrienne Rich - link aqui)

torn between bitterness and hope
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torn between bitterness and hope
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torn between bitterness and hopetorn between bitterness and hope
torn between bitterness and hope
turning back once again to the task you cannot refuse
turning back once again to the task you cannot refuseturning back once again to the task you cannot refuseturning back once again to the task you cannot refuse
turning back once again to the task you cannot refuse
turning back once again to the task you cannot refuseturning back once again to the task you cannot refuseturning back once again to the task you cannot refuse
turning back once again to the task you cannot refuse
turning back once again to the task you cannot refuseturning back once again to the task you cannot refuseturning back once again to the task you cannot refuse
turning back once again to the task you cannot refuse


O que sei de Adrienne Rich é como just nodding. Mesmo assim ainda confirmo que artistas se esperam.




sábado, 25 de agosto de 2012

amantes



Every kind of love, or at least my kind of love 
Must be an imaginary love to start with
                                                                              Rufus Wainwright


Certas vezes, quando mal se percebe a presença do dia e mal se consegue esquecer da noite, compreendo porque me são negadas certas respostas do futuro: preciso manter alegrias polidas, compromissos silenciosos, distrações eficientes, a fim de condescender aos apelos de felicidade tatuados em minha existência pela história física de homens, mulheres e placas tectônicas.

Presenciasse que, [somente no limite de duas mãos em concha], cabe o que sei do outro e quanto de meu futuro é guardado a ele, me faria escravo de qualquer mal; porém, das lágrimas que viessem, das ânsias que se construíssem, fato de preocupação seria, ao abrir da concha de mãos em desespero, fazer cair o que sei e não sei de mim: me perderia núcleos, seria um pensamento dissolvido num oceano duma pedra gravitando no escuro.

Desse outro que espero sem compromisso, desse outro que vejo noutros, espero que me toque as mãos, fechando-as, beijando-as. Me arrastasse a uma praia, necessitado de algo meu que o prolongasse no Tempo, e no que sobrar de Espaço, adorar meu silêncio ameaçando acordar.

A necessidade pelo outro se explica mesmo em olhar-se no espelho. Queremos o ou[t]ro de tudo, a juventude é feita de ânsias imemoriais, magnéticas.

Mesmo na espera, observando o pular dum pássaro de praça, DESEJO, busco através de radiação cósmica de fundo, Aquele, O Cara, O Outro.  


sexta-feira, 10 de agosto de 2012

I=∆P



I can't see the future
But I know it's watching me


Dias permanecem. 
Permanecem correntes (como rios? como elos?)?. 
Dias e suas partes, correntes em correntes 
— coar café; equilibrar-se no ônibus; fatiar cebolas; 
torcer, chorar, querer, esquecer pela televisão; 
suar durante o sono. 

Dias como correntes: 
cordas bambas? Cadeados? 
Orações?

Dias. 
Finjo prevê-los num sol mal acordado, ou mesmo no rosto estranho que encontrei na calota de um carro: obsessão secreta por unir sinais sem utilidade, para que não digam nada quando algo grande de fato acontecer. E não aconteceu ainda porque não quero, ou não posso. Ou porque me fará fugir mais uma vez do senso de controle. 

Mesmo que o futuro se torne um pacote a ser retirado do correio, os dias estarão lá, acorrentados a este pedaço que respira; ainda existirão os pressentimentos que, ainda que cientificados, não me convenceriam: me parece que revelações são possíveis, mas ainda tenho dúvida; e ao final de qualquer coisa, acreditarei em tudo.

Escolher algo para o futuro significa esperá-lo? Ainda que vá atrás, não o seria? E quando ele estourar em sangue, o que será? 

Espera. 

Espera por mais futuro. E com as vísceras enlaçadas ao sono cada vez mais curto da luz do dia, permaneço fingindo que prevejo o futuro. Mesmo buscando-o. Ou esperando-o. Ou vivendo-o.



sábado, 21 de julho de 2012

realidade/realização



Poetas modernos (espiritual, não cronologicamente falando), mais que creditarem à palavra o poder da materialização, seja em lembrança ou, nalguns casos, fisicidade, também a descobrem de sua função na usualidade, seja no contexto da arte poética e sua técnica e intuições, seja em sua possibilidade na boca do povo. O poeta, há muito, é parte do povo; digo, se tratando de sua atual e necessária entrega ao que o homem comum sente e pensa, que similaridades existem entre este homem e o poeta, que factualmente não são tão diferentes e distantes de si assim como nos querem fazer pensar.

Pessoalmente, como alguns sabem, vejo a poesia (ainda que em seu reduto escuro, midializada como quimera ou ornato às pessoas cotidianas, preocupadas com a vida itself, feito nossos amigos bichos o fazem  – culpa não da política literária, e sim da Educação) como possibilidade pedagógica neste mundo cubista que vivemos. A culpa, entretanto, de sermos confusos brinquedos do Poder ou de nós mesmos, não é do cubismo deste mundo de hoje, mesmo porque caminhamos para isso; o busílis que incomoda é a ineficiência de nossos movimentos emocionais ou prioridades intelectuais, que nos confundem mais ainda, causando distração mortal, distância de uns dos outros, medo, desamor, spleen, Vazio.

Exemplo do Vazio imemorial e significativamente engrossado por hoje ser hoje, é a busca/falta/impressão do a(A)mor. O corpo pede, a mente complica, o espírito chama e a cultura ajuda a sofrermos sequer uma (e de preferência, potente) vez deste bem-mal-talvez, que nos divide e define como seres do tipo essencialmente instintivo ao social – ou não.

Existe um poeta que descobri por acaso. Manuel Iris. Como o descobri? Em minha frequente busca virtual e in loco, por explicações e comentários sobre o que fazer de nós, poetas, e de nossa rede, a poesia, nestes tempos doidos, tridimensionados, iPadianos. A explicação que este querido deu (e alguns poemas do moço) você encontra em links aqui. O que busco, com toda a consideração acima, é um viés onde possa trazer um poema deste, poema que não me conquistou e 'disse' a mim somente pela beleza, ou pela clareza e limpeza. Conversou com uma situação frequente neste que vos fala, situação que certa solidão traz, e mais, uma solidão pequena, sim, mas cheia de fantasia, possibilidades e desejos ao futuro.

Não vou descreditar meu próprio discurso, quando de como vê, o poeta, sua palavra; que uso dela faz, que busca em continuar usando-a, que força (a)credita haver nesta constante humana, que é a possibilidade da expressão escrita. Faço/fiz uso do objeto poema para que buscasse e implantasse em frente a meus pensamentos envoltos na complexidade de um desejo por algo físico, o ser quisto (que dizê-lo amado, acho que seria insciente de minha parte), deitando-o como se fosse algo que se comesse no chão, alimento para o silêncio do son(h)o. Manuel Iris vem, e pá! na minha cara: como uma mãe que impõe um corretivo ao filho, encontrei no poema abaixo, em sua sutileza, a clareza que qualquer ser humano pede/merece para viver neste mundo.

Ampliando meu escopo de permissões em poesia, e claro, mais que isto, vida mesmo, Iris me tornou mais sozinho, porém, não me deixou de mãos vazias: deixou o conhecimento de que, a palavra em sua força ainda pode nos permitir viver grandes realidades, mas nos priva grande porcentagem das realizações. Agora, conhecido um caminho a mais, estou ainda mais certo de duas coisas: 1. o reconhecimento entre leitor (qualquer que seja seu tipo) e autor é algo essencial e pontual; os esquemas situacionais que regram estes encontros é vário e particular; e, 2. poesia, sim, para o literato ou não, é sim conhecimento, e do tipo imprescindível a todo ser: de vida, para a vida.


La decisión de oficio


Hoy concluí que por pudor
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::o por mínima prudencia
no debería de escribir poesía
con esta cínica intención de perpetuarte:


No le haces falta a la literatura.


Así que voy a hacer silencio
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::con tu voz
y con tus pies
y con tu paso de musita inalcanzable.


No le haces falta a mis espejos ni a la calma


ya no te pondré aretes
ni volveré a llamarte
ni voy a hacerte Salmos cuando estés dormida
porque el poema, escucha atentamente
no está esperando, como yo
que te aparezcas.


(Manuel Iris)


A decisão do ofício


Hoje concluí que por pudor
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::ou por uma prudência mínima
não deveria escrever poesia
com esta intenção cínica de te perpetuar:


Não fazes falta à literatura.


Então que farei silêncio
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::com tua voz
e com teus pés
e com teu passo de musinha inalcançável.  


Não fazes falta a meus espelhos nem à calma


não te porei brincos
nem voltarei a te chamar
nem vou te fazer Salmos quando és dormente
porque o poema, escuta atentamente
não está esperando, como eu
que apareças.


(Iris, tradução minha [com medo, mas minha])

“Mi vida es testimonio de que la poesía, la lectura de poesía, hace que la vida valga un poco más la pena. Agradezco, por ello, a quienes la han escrito, por hacerme sentir acompañado entre los hombres. La poesía es siempre eso: soledad compartida”, afirma Manuel Iris (Mérida, 1983). (fonte aqui)

sexta-feira, 13 de julho de 2012

ou isto ou aquilo


Aparando o que será meu primeiro livro, lembrei de um poema recorrente em minha vida, o Em meu ofício ou Arte taciturna. Lembrei, porque tinha lido um texto do mexicano Manuel Iris sobre funções da poesia, e lendo meus textículos, pensava como serão (ou não) recebidos. Considerei minha idade, minhas aparições e apartes como poeta, mas, o importante destas divagações foi a relembrança do porquê de fazer poesia, e de se fazer poesia nesta cidade, neste estado, país, continente... galáxia, etc. 

Eu que vezoutra leio um comentário ou outro dos 'doutores', 'cânones', 'monstros' sobre o que é ou não a poesia, e de que forma a tradição se descobre aqui ou acolá, tenho minhas reservas com paroxismos, embora respeite o dizer de cada um. E penso também que, no fim das contas, só teremos a responder a nós mesmos, se gostando ou não do que alguém escreve. Não à toa, faz meio que uns 400 anos que a poesia se tornou, essencialmente, um feito social, porém solitário, e nem sempre sociável

Diria Thomas, é para a vida estas palavras que deslizo, é pra criar beleza, é pra chamar atenção, é para o ego!, embora como falei acima, paroxismos são estranhos. Escrita esta obra por vir, espero que ela cumpra sua função: continuar a tradição de propor situações e artefatos humanos noutro sistemas de coisas e ideias (Iris). Mesmo sendo um poeta sujo de albume, existem questões de talento e técnica que se jogam por cima da expressão deste sistema para-tecnocrático e oficial (a Arte em geral, né?), e creio que isto é a real preocupação dos acadêmicos. 

De qualquer modo, dentro do poema que seja, mandando ou não a tradição ir-se à merda, pensando ou não em funções para a poesia (muito mais questão do zeitgeist que dela em si), o lugar no mundo do Artista é sempre levantar as saias, socar um cretino, enfim, cometer crimes, em níveis variados, mesmo nos da ingenuidade. A função da poesia é agir contra (por vezes, a favor) o fluxo de erros que nos impedem de ser feliz, agir contra a clausura da convenção moderna, fazer perder o ar como o faz um beijo roubado [mas sempre falhando em gravar isto no papel sulfite].


quinta-feira, 5 de julho de 2012

you just ain't receiving





You'll be given love/ You'll be taken care of/ You'll be given love /You have to trust it
Maybe not from the sources/ You have poured yours/ Maybe not from the directions/ You are staring at
Twist your head around/ It's all around you/ All is full of love/ All around you
All is full of love/ You just aint receiving/ All is full of love/ Your phone is off the hook/ All is full of love/ Your doors are all shut
All is full of love!/ All is full of love/ All is full of love/ All is full of love/ All is full of love/ All is full of love



Não mais manhã, nem tarde ainda, mas quero permanecer adormecido, com os olhos sentados. Sinto por mais alguém, mais dois, mais treze, mais um mundo. Sei que sinto e sei que não pedi por sentir isto à Criação. É de fábrica. E o que não é Criação, me fabrica? Penso esta dúvida toda vez que tomam isto que chamam de 'amor', desembrulham de Deus e afirmam que ainda é a mesma coisa. Daí filosofias vão e vem, mas também foram fabricadas? Por que só a voz dos homens me chega? E por que nego a maior parte delas? Por que duvidar de vozes sem carne?

Adormecido, sem direções que se queira seguir, predizem minha vida como se nada soubesse dela. Tomam o gato com quem brincava. Me obrigam a dormir quando a casa ficou sozinha, e vamos para muito longe, onde o menino não pode ir. É assim desde os 5 anos e desde 5 séculos. 

Não precisaria sequer pronunciar 'amor'. Deixasse-o pousar como o mundo ao nascido. Peço a quem sabe: não meça o amor, não conte o amor, não busque o amor, considere não esperá-lo como todos os olhos do mundo o esperam; olhos que se fazem nossos, olhos que não pertencem sequer aos donos.


sábado, 23 de junho de 2012

servicinho de utilidade pública



Bittinglust, Oriebiro, 2012


Há quem guarde uma atitude, uma mágoa, uma canção, um grito, um desejo, um soco, um arroto. 
Eu guardo um poema, que é tudo isso também.

Enquanto não o percebo escorrendo pelos ouvidos ou dedos, qual o chorume deve, te/nos aconselho: 

- olhe para alguém que te atraia, pelo motivo que for, quem quer que seja;
- arme a situação perfeita em sua mente;
- permita que os perfumes, os gestos, as vozes ganhem consistência. 

Então


cometa um crime.





segunda-feira, 18 de junho de 2012

Rena Effendi

Rena Effendi: Liza's landlord Sima's bed. Sima is 22 and alcoholic. Osh, Kyrgyzstan. September, 2007

quarta-feira, 13 de junho de 2012

profundamente


Profundamente
Manuel Bandeira

Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes, cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam, errantes

Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam 
Ao pé das fogueiras acesas?

- Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.

*
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avó
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão eles?

- Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.

e e e e e e e e



As palavras entrançadas neste instante parecem intrusas, enfiadas na tarde que foi feita para se comprazer em corpos outros; acontece que me sei poluído, desgastado, entortado por vozes, gestos, silêncios, olhares, mentiras na parede... fosse aquela ânsia tradicional, que tempera cada expectativa e valoriza cada ação que será esquecida, mas é coisa que embruma a vista e a certeza, rasura o ritmo da grafite deslizante e revela o quanto perdemos, ou o quanto outros ganham.

Claro, falo de poesia, e quero falar do problema (neste momento coletivo) mais intrigante para quem a valoriza ou não:  o que me diz, ou não, a poesia? Pra que serve, como faz, por que existe? Ainda existe por que existe perda de valores, de auto-consciência, de abertura. Quem a impede, tem sua razão. Mas é precipitado vê-la como mera distração. Mesmo quando entretém, re-circula no espírito do entregue o peso de ser humano, para o bem e para o mal. Parte do problema se chama, simplesmente, preconceito, ou ainda, falta de sensibilidade mascarada por teoria desperdiçada para fins fátuos. Isto é desrespeito e desserviço ao estudioso e ao artista.

No fundo, particularmente, me interessa uma poesia que chegue às mãos do leitor crítico e sensível à Arte, por mais que este caminho se encontre cheio de obstáculos há pelo menos 100 anos (Pound o diga...); sei que, por segurança, o poeta procura estar no mundo do alto estudo ao mesmo tempo que, consciente das diferenças de recepção, cisca algo no campo daqueles que não precisam deste estudo, estão satisfeitos em sua curiosidade, cheio de inteligência, mas que se afastam da arte da palavra por razões que considero de cunho socioeconômico, ainda, só que com uma pitada de ilusão acadêmica, que, SIM, admito, contamina a boa parte dos escritores, incluso eu.

Só queria em meio a estas palavras (vide também poema acima) meio desengonçadas jogar um pouco de luz sobre a beleza simples e por vezes incomunicável de todo tipo de poesia, onde quer que esteja. E que vejo as pessoas se fecharam tanto em si mesmas, aos outros, que, embora não lhes tire motivos, pediria que relativizassem, e dessem chances à intuição, ao diálogo, à sutileza de certos gestos e palavras; embora certamente piegas e clicherento, creio piamente neste discurso: a vida (sumo de qualquer verso), meus senhores, é curta, bela e expressável.

[inspirado pela redescoberta de Bandeira, ontem, numa aula de Literatura Brasileira...]


domingo, 10 de junho de 2012

coming soon



Em favor de minha descoordenação natural e fuga da realidade acadêmica, este post é uma invenção dum domingo que precede uma daquelas semanas que te chamam a não esquecer os meandros necessários àquela, um dia possível, Liberdade. Ou seja, embora existam pragmatismos a absorver, estou aqui, de pernas moles, descrevendo possíveis leituras a um compaixonado, para poder trazer a esta para-realidade, realidades, que aguardam numa gaveta (pode chamar também de sistema de arquivos) o dia de se fazerem notícia pública: O PRIMEIRO LIVRO (DE VERDADE) DE SEBASTIÃO RIBEIRO.

Já comentei algo aqui sobre a história que vai desembocar em, no máximo 1 ano, em meu primeiro livro 4real. A diferença é que, apesar de vestido numa camisa que todos aprovam, estes poemas usam moicanos. O livro que virá é diferente, único, e por isso me convenceu a ser o primeiro, porque é uma obra como projeto. Atenção e ampliação de seus sentidos por parte do leitor são irremediavelmente necessárias, pois assumo há algum tempo a postura de quem não indica a poesia-água-com-açúcar para diabéticos. Tipo, "- Ei, o mundo é hoje e isto aqui, eu sou poeta, você não parece ser um, mas talvez seja. Por que não se permitir?" or something like that. 

Em favor de minha descoordenação natural e assumir minha sub e íntima celebridade sob lençóis encardidos, gostaria de dizer que esta obra existente, apesar de, como a maior parte da obras neste sistema, está aberta à interpretações, há um algo a ser dito sobre: é fruto de pessoalidade, sim; mas carrega uma conexão com o mundo tal, que nega o cliché antecipado da palavra bonita do poeta-princesa (aquele que fica na torre mais alta do castelo protegida pelo dragão, esperando o Prince Charmant...). É como se levasse trabalho pra casa, ou estresse para a cama, mas, diluindo-se isto em palavras, num gênero aperitivo depois do jantar (vide Carlos Felipe Moisés - Poesia e Utopia), provável que isto não impedirá o leitor de apreciar com olhos menos saturados a realidade, das muriçocas que adoram seu corpo na hora do sono aos encostos de bancos de ônibus que adoram torcicolos.

Acrescento (este parágrafo é inspirado na possibilidade de ser impossível entrevistarem o rapazinho aqui a sério - MEU a sério) que nos primeiros poemas existe um intencional uso de surrealismos. Cri importante e necessário explorar isto em meus poemas, sem medo de parecer incrivelmente não-lido ou incompreendido - leia-se: hermético - em benefício da força de expressão e assunção da toca em que todo ser humano se encontra quando decide se esconder (não fugir, ok?) do que os olhos assumem a seco (rotinas, durezas, necessidades et coeteras). Entretanto, nos últimos poemas, óbvio se encontrarão traços de ilogismo (isso é poesia, né?), só que conjugados com uma contenção da impressão da realidade tal, que me percebo como fundamentalmente lógico no fazer poesia, isto se tomarmos conscientemente as devidas proporções.

Encerrando: este livro a sair é, essencialmente, um painel onde as diferenças de pensamento e percepção do mundo (e suas pequenas coisas que a priori não parecem parte dele) se fazem marcantes. É um livro sobre sensibilidade artística ricocheteando em janelas de vidro e olhos de concreto. É, também, sobre fardos que todos carregam, porém está claro que, quem resmunga seu peso aqui é isto que convencionamos alcunhar poeta. Mas, não esqueçamos, é um livro para todos, além da leitura ser algo suposto a ser democrático. É um livro que fala para quem pode escutá-lo. 

Vai encarar?

COMING SOON: cenas do próximo episódio...


segunda-feira, 4 de junho de 2012

cuspir ou escarrar


Apesar de estar num mood estranho para a coisa, decidi chorar um pouco sobre isto agora ou sabe-se lá quando; não me espero um post super argumentativo ou estilisticamente belo e longinquamente lírico, só gostaria de poder cuspir de vez em quando: ando a fuçar um poema aqui e ali, um comentário sobre o que fazem aquele ou um outro poetinha, e quanto mais perfuro, mais realizo que minha vontade é fugir daqui, mas antes, roer a corda que sustenta a poesia leve e fácil, mas, especialmente, o texto vestido em sete véus, coberto em perfumes e arabescos, ostentações góticas e art noveau... Uma poesia que não tem a ver com a pesquisa estÉtica do grande modernismo (ou dos grandes inconformados). Uma poesia que não se arrisca na bursite, no cheque especial, em tomar um ônibus bêbado. 

É extrema e absolutamente provável que meu discurso não tome contornos maiakóvskianos. Escrever é necessário, entretanto, quando excessivo, suicídio, se todo o povo ao seu redor não for pelo menos certa razão de tanta ânsia por expressão. Quando falo povo, falo do internamente famoso LÁ-FORA. Suicídio artístico se, não considerar a situação leitora neste Estado... 

- ADÉLIA ME AJUDE!!!!
- "AJUDO", DISSE ELA.

Certa vez assisti a uma entrevista com a direta Adélia Prado, em que dizia que, se pensasse no interesse de quem lê, nada poderia escrever. Concordo. Situação leitora aqui significa má preparação do espírito e da capacidade dos novos e nunca-leitores deste Espaço... Estes leitores que ainda veem a poesia como uma rima necessária às flores e amores de sempre... Leitores que ainda estranham Gullar no exílio, referências à inconstância humana em Bioque Mesito, poesia ciclo diegético em Domeneck... Isto é briga que meu molotovizinho não entra. E já que ataques nucleares ao problema seriam politicamente incorretos (f*ck the politics), digo que a mudança começa em cada gesto na consciência do leitor crítico, do poeta, da academia, da escola, da mídia, da cultura etc.

Vejo que não cabe a nenhuma das partes envolvidas ceder em totalidade, descer degraus. Falo em algo que Bioque Mesito inclusive me lembrou certa vez, falo de cantar seu tempo. Tradição? Originalidade? Herança? Etceteras? Tudo ressurge quando de olhos e ouvidos atentos, tanto da parte de quem lê, quando da de quem escreve. Poetar na língua do brasileiramente compreensível tchêrêtchêrêtchêtchê¹³²³¹²²? Não, claro. Falo de mudança de atitudes à conta-gotas (o estrago foi feito há tempos...) na maneira como a intelectualidade se disponibiliza ao leitor, vice-versa. 

Se fosse eloquente, discorreria longas páginas de nuvem sobre a função política da poesia, especialmente em momentos como estes (o sempre agora).  Moisés  já fez isto lindamente, além do já citado Domeneck, e de tantos outros... Me furto de tecer, neste instante, mais algum retalho, porque costumo guardar a minha tosquice a meus versos melados de indie music... E como poeta-antena, um sinal em HD exigiria atualização do software. Não sopro para o lado do discurso acadêmico, deixarei a alguém mais qualificado e (e Jesus permita) espirituoso a tarefa de traduzir este código chamado escrita como atitude. A complementar, penso que, além de cantar, viver seu tempo individual e coletivo demanda alguma catarse. Cada um tem a que merece... ou busca (ou acha), não é?

Em linhas tortas e gerais, daria meu exemplo: preparação, falar da vida. Escrever e ler na consciência de sermos pequenos e o planeta, lombada cósmica, onde alguns vírus fazem silenciosos o trabalho de metralhadoras. Ser natural, naturalmente. No sentido de que carros constantemente navalhem inocentes em sua velocidade;  no que o que chamam amor convide banalidade. No que se refere à perda e à assunção e fins eminentes. Não permitir que escorra o tempo do que faz diferença ao ser dito (e re-dito).

[e o meu livrinho está se coçando todinho o bichinho para brincar disto...]



domingo, 27 de maio de 2012

PROBLEMA ALGUM!



problem_nothing_problem, Oriebiro, 2012


Eh... penso que sejam figuras de alguma coisa (talvez, linguagem) ou um código meu e ancestral ao mesmo tempo, que espuma água negra sob meus olhos, e sei, que o bullshit que vier deverá ser poesia. Se é poesia, é problema.

O problema é quem ainda em redor de mim pense que poesia não se pensa.
O problema é a educação deste Estado, que busca uma Antiguidade a quem culpar, e assim justificar a alguns o caráter destrutivo de ler para pensar.
O problema é que o poético tem a força duma guerra, mas ninguém morre e o sangue sempre terá cheiro de livraria gélida.
O problema é a necessidade da mudez. A facilidade da mudez. A incompreensão da mudez.
O problema é que achamos ser um problema termos problemas.
O problema é crescermos sem dar-nos conta.

Há problema em falar de flores e amores.
O problema é o que hoje, é o amor. O problema é o que hoje, é a flor. Ambos comunicam beleza, entretanto, se gastam e não param de germinar.
O problema é estar _________________________________ nas tardes de domingo sem cerveja e happy faces.
O problema é ser _________________________________ na percepção dos ângulos que guardam os relógios todo santo dia.
O problema é a poesia escondida em sua quitinete, o poema guardado para o dia da festa, o poeta-camisa-nova-de-domingo.

O problema é esperar.
Esperar é temer.
Esperar e temer.

O problema é temer.

Temer.
Temer.

domingo, 20 de maio de 2012

indução (ou, e se...)


Minuto a minuto estar ciente é suportar uma chama nas mãos cujos dedos não consigo te convencer a enfileirar aos meus mas enfim minutos trotam num pensamento calado que parece estar orando por teus olhos atrás das cortinas amareladas tento sem rodeios te cobrir em minha razão de papel jornal insisto em te pedir que não percamos tempo não daremos tempo ao tempo a isto que nos faz unidos ou ao menos persiste em me boquiabrir  – isto é insanidade é quase certo que acertaram-me os joelhos a porrete e me jogaram contra os galhos.

Nestas palavras experimento uma ponta de máximo.


sexta-feira, 18 de maio de 2012

camisa gola v



...e me vendo naquele espelho de provador, não pude refletir meus silêncios do modo como sempre faço: com as mãos no queixo. Isso tudo (em música interna) por causa da visão de um corpo novo, uma proporção estranha, um andar sempre desconfiado em andar: tudo eu e meu.

Estranhar-me assim deve ter vindo a delimitar meu desejo ou o desejo em desejar, tão comum a quem quer ser "tão", como eu. A principal forma a ser posta em cheque pré-datado foi a necessidade física, psicológica, cultural ou histórica de simetria: onde estarão meus outros lados, meus outros pares de lábios, os quatro braços, muitas pernas, vários quadris? Vieram então recomendações ao meu estado de 24 anos e o quanto isto REALMENTE vale na linha do tempo. E vale? BUSCO TODO O TROCO POSSÍVEL NUMA POSSÍVEL VENDA DE MEUS VINTE E QUATRO ANOS.

Percebo então que não há problema algum (ainda), há busílis. A busca. Por qualquer que seja ou esteja qualquer coisa. A busca. Então, sempremente, me calo. 

Então volto, sem Deus que me guie through musica universalis 



quarta-feira, 16 de maio de 2012

ócio recreativo



Durmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordodurmacordo


de repente me exijo escrever mas o quê?
Seria mais fácil transcrever um tudo certo do nada ao um leitor escaldado, porém, o que será escrever do nada um tudo se construindo num leitor recostado?

Pênsil, a dúvida permanece com gosto de devir necessário, mas lento, arrastado. Pêndulo, a dúvida não teme o fim de quem duvida. Ela se esconde nalguma estrela, talvez, e resurge quando não se tem certeza do fato de que mortos se chacoalham em suas tumbas, ou que estão lá-além-longe somente e quem ainda é de carne, osso e pedra tem de tragar o tempo e suas dobras lúbricas em três cartelas de cigarros por dia.

Contudo, ainda virá a morte, a consciência do que é vivo, a dúvida... e o tempo?
Dúvida que só há nisto-eu-vivo até que a morte os separe num instante que não sei.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

apenas mais uma sobre a perda da inocência...


Este é mais um poema de Acorde que gostaria de compartilhar com vocês. Certo que estou meio numa nova fase, mas este primeiro passo é importantíssimo, tanto que foi dado. Creio que este é um dos textos mais acessíveis aos de sensibilidade. Curta mais de Sebastião Ribeiro em Acorde aquiaquiaqui, e, claro, AQUI:



choro por inteiro
porque um dia fui cercado
em braços brancos


por não saber falar
a consciência não existia
especificamente para mim
seu dono seu caminho


hoje sem desculpas
em busca de um motivo
choro sim que quando precisei
articular um balbucio ainda não
conhecia ermos antárticos nem
enfrentava contradições inteligíveis


choro entretanto pela fenda
tão disposta à fundura entre
um gesto e outro
– o que conduz alguma afasia
porque ainda as repetições não
somente são flores em árvores em
avenidas em pedras em homens


choro certo que nem
toda opção se prende ao corpo
(já tão cheio de assovios)



certo que hoje o corpo
não pareceu escolher a coerência
que tornasse a noite eterna
mas é que quando acabarmos
não reconhecerei o passado
em que me calo visto que
não precisava de palavras





ef


quarta-feira, 25 de abril de 2012







Hoje, conheço a esperança mole feito um peixe numa sacola de feira. Lembremos queste peixe nadou, foi iscado, estripado e congelado. Alguma hora fará a alegria de algum estômago.

Onde na esperança mora a fé e onde na fé se deixa recostar a esperança? NÃO SÃO A MESMA COISA?!?!? A conjetura desta resposta me abate: virarei a página até onde der, esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado.

Esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  

esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado  esperarei um sono intenso que me faça acordar atrasado.

Hordas de fiéis alisarão meus calcanhares, meus problemas estarão resolvidos por uma semana, esquecerei aquele compromisso porque beberei com meus amigos, mamãe me lembrará que crer em Deus Pai me cobrirá nas noites estúpidas, quando me esqueço de esquecer dos muros à hora de dormir. Uma criança desconhecida precisará de minhas costas e meus braços para se equilibrar num banco, um gato de 3 semanas vai encontrar comida, o jumentinho que ronda meu bairro vai logo encontrar um fim pacífico para seu quadril atingido por um carro. E todos os meus esforços pra fazer algo direito ou novo, politicamente correto e crítico, científico e expressivo, estarão neste encanamento entupido há duas semanas. Assim como o eu escrito.

Questões de fé/esperança me parecem meus olhos tentando raciocinar o grau de meus óculos. Não somente ver, raciocinar. Detalhe: olhos completos não raciocinam. Nem se se pudessem enxergar o dia inteiro.

O abraço que falta, o silêncio que castra, o dia que logo entardece. Sobro eu no silêncio incógnito, sobra de silêncio acordado pelos que falam. Sobra-me a mim mesmo sem espelhos e sem esperança.

Até que me canse de esperar um sono intenso que me faça acordar atrasado.



terça-feira, 17 de abril de 2012

toc toc




Visite a casa de um poeta quando ele não souber o que dizer. 
Visite-a quando não souber o que dizer. 
Quando houver o que dizer, 
visite-a uma vez mais para que nada se saiba. 
Saiba que uma visita lhe dirá alguma coisa. 
E em não dizer nada é provável que se saiba algo. 
E sabendo, não diga. 
Visite-a. 
Sendo casa, saber ou dito, 
o poeta ainda é uma visita.



segunda-feira, 26 de março de 2012

fato


Sou do tipo de gente que confere toda sua vida aos 24 anos e não está esperando quase nada. O poema último poema, o beijo último beijo, a festa última festa, contemplação última contemplação; mas, quando se vive assim sem de fato saber que se vive assim, na verdade, nem se importando em riscar todos estes fósforos fora do pensamento, como se fossem a extensão da realidade física, pouco importa mesmo. Viver é um conhecimento, estar vivo não basta.

Cansa viver do artifício. Ser duro, pungente, patético, bêbado, tudo vale para não esconder você. Deixar bem claro com o que lidam. Como o Sebastião na roda de amigos ou como o Sebastião cuja voz te chega simples e somente por um texto ou uma foto. A arquitetura da expressão facial e corporal guarda bem mais que colunas coríntias, mas temo em constatar ainda poesia-hera-no-muro. Quem me diz pra que serve aquela hera nos muros de tantas casas, especialmente as casas da classe B e C? Existe poema que serve mais. Mas para minha suposição acerca da função da poesia, neste caso, também ajudaria a perpetuar atos parnasianos de alguns pares.

Este é o único motivo que me faria sacudir, falando de poesia. Já dizia Criolo:

“Buquês são flores mortas num lindo arranjo...”

Na atual situação da consciência e inteligência mundial (imagine a capitania hereditária do Maranhão...), todo verso já nasce agonizante. Quem enxergar além das vanguardas, me mande um e-mail, por favor. Com dedos sempre roídos, continuo escrevendo (diria, rabiscando) minha passagem ciente por esta dimensão. Ir além dela machuca o horizonte com o esforço de tantas vistas se apertando, só que não para forçar o choro. Talvez. Contudo, neste planeta, a primeva voz não usa palavras. A natureza espera? Não saberia responder com exatidão no alto de meus 24 anos.

Abraços aos leitores e floristas, e, por obséquio, me desculpem os clichês.

segunda-feira, 5 de março de 2012

(im) preciso



Em meu ofício ou arte taciturna
Exercido na noite silenciosa
Quando somente a lua se enfurece
E os amantes jazem no leito
Com todas as suas mágoas nos braços,
Trabalho junto à luz que canta
Não por glória ou pão
Nem por pompa ou tráfico de encantos
Nos palcos de marfim
Mas pelo mínimo salário
De seu mais secreto coração.
Escrevo estas páginas de espuma
Não para o homem orgulhoso
Que se afasta da lua enfurecida
Nem para os mortos de alta estirpe
Com seus salmos e rouxinóis,
Mas para os amantes, seus braços
Que enlaçam as dores dos séculos,
Que não me pagam nem me elogiam
E ignoram meu ofício ou minha arte.
(tradução: Ivan Junqueira


Sua vida é a poesia ou a poesia é sua vida, meu caro de dedos tortos?
Aceite o silêncio, não peça nada mais que um beijo no local certo, sonhe para não se entender!

Deixe estar o corpo, permita qualquer coisa ao sono; que as palavras faltem, e teu silêncio, assim como grande parte do que imprimes, será de dois pares de olhos e algumas coxas.

Inspire... E perca... Perca qualquer coisa, este mundo é dos fortes, mas perfeito é para os fracos. E no final de qualquer lógica, ou de qualquer erro nesta lógica, restará o profundo e suave desejo de ser um poeta que escrevinha... nada!

E o poeta merece o sono de seus poemas, objetivamente falando.

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