quarta-feira, 6 de julho de 2011

você referente

Ando dormindo, mas com a baioneta ao lado. E não sei ao certo, porém, mesmo um vulto corre o risco de se machucar com meus golpes no ar. E como guarda que vigia,  inevitável o cansaço esmurrá-lo. Daí uma suposição, se vigio por proteger ou vigio por exigência – de quem, vai saber.

Esta tentativa de metaforizar acima é produto do que creio acreditar (!) como viável – vejam: viável, não certo; do que creio realizável e compartilhável em poesia. Penso aqui que, para ser visualizado aqui, teria que discorrer com minhas parcas armas de defesa sobre pra que raios poesia hoje e onde faz e como se come; acontece que de certa forma diluo isto por aí de tantas maneiras, que a única maneira que vejo como verdadeira para considerarmos a poesia atualmente é: relaxe... e goze, se puder.

Tentarei mais uma vez me explicar. Acredito piamente na capacidade das pessoas, do ser pensante, digamos, até que este se prove indubitavelmente incapaz de coisa alguma. Quem escreve ou quem quer pensar quem escreve ou como quem escreve ou se não escreve, o quer fazer sem pensar, ou ainda, pensá-lo sem fazê-lo, nos ajuda com o descrédito de que a recepção não é importante. Eu digo, sim e não. Explico novamente: a palavra chave para uma boa relação com o leitor ou o vendedor de ovos da esquina é relativização (Deus, mesmo o Universo e a Natureza são relativos, por que eu quereria ser absoluto?!). A recepção geralmente não deve se meter no trabalho do escritor e vice-versa. Por que? Porque a relação entre quem escreve e quem lê é cimentada na afinidade e na reciprocidade. Do contrário, ambos se contradiriam como um ou outro.

O diálogo é deveras importante e construtivo. Mas como disse acima, creio na capacidade do ser pensante (e sensível ao que pensa, da forma que for), e o leitor é processador, não criador. O leitor (eu e meio mundo) é re-criador. A beleza e funcionalidade da coisa estão aí, e, finalmente, espero ser considerado (ou compreendido) quando digo que nem a re-criação, nem a criação (que seria, aqui, criação?) são coisas limitadas, apesar de certa forma exclusivas de suas partes; a criação é um processo, um caminho, que naturalmente começa num ponto e paga seu pedágio noutro – e está implícito seu não-retorno ao ponto original da mesma forma como deste foi-se. E esta condição não impede interseções.

Considerar este tipo de coisa é especialmente estranho ou frustrante quando em falarmos de poesia. Nestas universidades. Nesta cidade. Neste país. Poucas mentes veem a coisa de forma holística. A força do texto poético carrega uma filosofia e uma consciência do mundo (onde quer que esteja localizado) que muitas vezes um romance ou um conto não alcançam. Vejo por este viés uma das razões da sobrevivência da poesia. S-O-B-R-E-V-I-V-Ê-N-C-I-A. Não que creia que ela morrerá, mas como os famintos de África, vão-se alguns; outros aparecem. Neste caso, a poesia ajudaria a sensibilizar a coletividade, mas, nem preciso dizer que, quem viabiliza as coisas nestas civilizações civilizadas não é o poema ou o poeta, e claro, a política. Vejam porque a poesia social é uma das formas mais fáceis dum poeta se queimar. É necessário ter consciência, e, se possível, engajamento físico para a mudança. No mais, se isto não faz parte de sua personalidade ativa ou passiva, reconheça sua condição. Os rótulos e as exigências são outra maneira de controle, e falo aqui especialmente do tipo de controle anímico, e que, vai saber, deve ser atávico em alguns. Circulando, se lembram do dito ‘cortar o mal pela raiz’? Seja bem ou mal, alternativo ou capitalista, a raiz é permitir à sensibilidade tornar-se física, ou pelo menos visível às relações entre humanos-humanos e humanos-coisas.

Finalmente, quero lembrar que existem duas espécies de hermetismo em poesia: o da linguagem e o do couro de quem escreve. Ambos criam barreiras, mas as Guerras Mundiais, a do Golfo, a do Afeganistão e a do Iraque nos mostraram que nada neste mundo ainda é intransponível. É uma questão de relativização e sensibilidade. De quem ataca e de quem é atacado. Daí haver vencedores/perdedores, sobreviventes/mortos, e as possíveis combinações entre estes elementos. A recepção é muito vária. Os escritores, tão quanto. A ditadura das personalidades leitoras, escritoras e consumidoras existe, mas como quando coerentes sabemos, este tipo de situação causa mais que preconceito e confusão, causa intolerância. Uma das causas do distanciamento do público-leitor da poesia foi o hermetismo, o desafio, às vezes, desmedido contra a lucidez. A lucidez não necessariamente quer dizer objetividade, e objetividade muitas vezes é confundida com síntese da síntese. Mesmo assim, não me atrevo ainda a levantar bandeira quanto a isto, pois acho que minha condição de Artista e missão como Poeta é de certa forma maior que isto. Ossos do ofício. Condições do amadurecimento – sempre possível e presente. O hermetismo de fato inútil ao ser humano, como espero que tenhamos percebido, é o hermetismo do espírito.

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