domingo, 30 de maio de 2010

Sobre o projeto poético

Aos olhos dos outros, um homem é poeta se tiver escrito um bom poema. Aos próprios olhos, ele é poeta apenas no momento em que faz a última revisão num novo poema. No momento anterior, era apenas um poeta em potencial; no momento seguinte, é um homem que parou de escrever poesia, talvez para sempre. 
W. H. Auden

É indubitável que as caudas dos cometas carregam perguntas... Por algum motivo, carregam gelo também. Enfim, é por aí das tantas que se vão e voltam a cada 76, 6,619 ou 3,31 anos, que se impõem os caminhos percorridos e/ou a percorrer sob as ações e razões que se imbricam em nossos passos vivos ou arvoram a impor nós mesmos a nós mesmos constantemente. Vinda da casa das questões existenciais/teleológicas, a consideração da condição de poeta argumenta sempre contra e a favor do humano escrevinhador, disposto a se jogar num poço depois de perceber-se, à la Macabéa. Acontece que orbitam em nossa ingenuidade as luas talento, tino, originalidade, tradição, cópia e fatuidade, entre alheias análises óbvias e várias; por este fio, desconfio: para um novo, antes que haja, qual o objetivo do escrito e seu lápis?

A juventude, por mais Três Graças botticelianas que seja, é um peso a quem ainda a absorve no ritmo do que deve ser feito e do que está acontecendo. O mundo, queridos, o mundo é este e fugindo de um despropósito, proponho: o que fazer agora? O mundo é também algo que pertence ao hoje, não esqueçamos. O tudo lá fora aos olhos de um jovem não necessariamente carece de ser lapidado, entretanto o depósito voluntário no papel carrega mais que deslizes duma esferográfica. Carrega essencialmente o que no mundo foi e vem sendo feito, literariamente apontando. E não vou por aqui, que essa história em tradições e cânones já é dérmica.

Creio que o vértice desta insônia vem ser a consciência. Que ela traz consigo? Conhecimento, atualidade, domínio da condição literária, da forma proposta. Existe consciência em seu lápis? Provavelmente exista ao menos validade no que vai surgindo... Penso na ajuda que Pound deixa: Repetir para aprender, criar para renovar. Creio que o vértice desta insônia vem a ser a consciência... da condição, do caminho percorrido, da base que vem sendo construída com o próprio barro, nunca com tijolos comprados. O aprendizado em poesia existe nas coisas e textos diários, e ainda crendo, constato que os passos deixados durante qualquer caminhada (pistas) vêm da experiência. O Tempo, felizmente é relativo, por isso, deixamos por aqui de nossos corpos e mentes mesmo, o problema das marcas, das perguntas, das memórias. Arquemos com as consequências!

Penso finalmente em delimitar (após reconhecer) a existência do por que faço e para que faço. Longe de resgatar o universal histórico dos artistas de todas as épocas, só poderia responder ou calar por mim. Até porque esta espécie de ver-se no espelho é fundamental na caracterização da poética dos que, antes que iniciantes ou anônimos, só agora se fizeram brotar longe do receio. O mundo sempre esteve à sua disposição, mas existe um momento na vida de qualquer um, em que o mundo se dispõe a ser abraçado, mesmo que às vezes abarcado napoleonicamente. Dito isso, digo que escrever é estar do outro lado... A palavra é meu domínio sobre o mundo, sacam? Inegavelmente é a confissão mascarada ou a relativização do Estabelecido ou ainda a ideologia rasteira que justificam algumas madrugadas invadidas. O homem em sua poesia é atuante, no mínimo, em seu próprio estado. Aquelas estórias de demiurgia ainda não chegaram aqui. Aparentemente.

Gostaria de poder manipular a conceituação e poder escapar à toda ordem pragmática que me assombra a nuca, porém, ainda não (re)conheci as fisicidades e suas cartilagens na recepção e inclusão do texto poético atualmente. Verdadeiramente nem me permito acreditar se gostaria de sabê-lo. Aindo vivo noutro mundo aos que me sustentam a crer em mim-mesmo-escrito = os jovens intelectuais, os poetas que amamos e aquele que somente eu nesse canto amo; todos eles e eu sabemos que, tentamos e tentaremos enquanto houver diferença na resposta, na definição, insistiremos como mais viável saída no silêncio. Essa vida toda de estudante testemunhando a crítica e a teoria tem seus erros (que venho corrigindo, lambendo o que mais me individualiza, como um poema), ressalta revivendo a poiesis e encerrando sua força num corpo material. Por isso, vivemos nos calando, não é, Rimbaud?




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