quinta-feira, 29 de abril de 2010

Pelo dito hermetismo IV ou O Prazer

Lutar com palavras 
é a luta mais vã. 
Entanto lutamos 
mal rompe a manhã.
(...)

(Carlos Drummond de Andrade - O Lutador)

Hoje, acumulo a memória ligeiramente puída e desconcertada dos poemas que vão e vem, às vezes sequer respingando sua dobrada memória. Como o pissing, que exige uma especialidade ao paladar, a poesia de todos os tempos exige mãos certas ao seu gosto. A variedade de estilos e formas, temáticas e imagens é imensa. Geralmente, por falta de educação (ou por falta de paixão...), em nossos corpos não existem enzimas capazes de ir além da mímesis; por aproximação ao mal informado que creio ainda estar levantado, digo que isto é uma questão em latim, também, querido: imitatio. Lembra? Prossigamos.

Aqui, ainda sobre a historicidade individual em minha memória poemática ligeiramente puída, conjeturo reavaliar o estado de morte ao qual os textos e poéticas novíssimos que surgem estão. Eu, claro, incluso aqui. Explicando, o estado de morte ao qual me refiro é a recepção dolorosa. Essencial que os leitores, profissionais ou não, esqueçam a política do ócio, pois que a poesia é de fato, meio de conhecimento. Aos antigos era didática, aos modernos, catártica, salvo absolutismos. O meio de conhecimento existe inclusive como a substância empírica do prazer. O que sustenta leitores, críticos, estudos, cursos, nomes: prazer.

Por que o texto em circunstâncias contemporâneas adquire aquela dor indiagnosticável? A convenção já não responde às circunstâncias. Realmente, o que está doendo e se remói em convulsão lírica, vocabular ou frástica (queridos leitores inocentes, levem minha mensagem), é fundamentalmente a mesma imitatio que não corresponderia primeiramente à tanto avanço ou ousadia, ainda que fuga. Mas é cada vez mais perceptível a consciência e a atividade da condição atemporal e primeva da poesia como objeto ou organismo linguageiro (até linguístico) existente na intersecção ou arredor da convenção da escrita. Profundamente guardaremos isso, não é?

Acrescento outro ponto: o classicismo ainda ilhado por alguns contemporâneos no cenário poético brasileiro atual reforça meu comentário parco: o culto à formas e temas tradicionais, reforça o desconhecimento de alguns não ousados receptores, porém encharca o fazer poético testemunhado do frêmito do prazer. É a forma antigamente nova de se bolinar a convenção... Totalmente, tudo é válido. Definindo neste canto de sala o que distingue o que é válido do bitolado e trivial, existe a musicalidade, a metáfora inusitada, o tema oculto, o orfismo esperançoso, e outras exigências que como tudo em poesia, atravessa os rios e o vento, reviram e engolem cidades, mas tudo voltará a um lugar são de intempéries. Registremos também a questão de 'olho'; bem, para isso um bom cabedal literário é indispensável.

Queridos a quem a curiosidade tocar, remarco o underground das questões óbvias: que fundamentalmente todo texto hermético é feito pra ser compreendido. Não, não estou subestimando sua inteligência; é que, como anteriormente resposto o conceito da condição inerente à poesia de passear por fora do reino, a unidade de hermetismo guarda sua liberdade de interpretação ou impressão, ainda sentimento. Guarda aparentemente tanto, que aceita o sexo de todas as chaves. Segundo, o poema, à vácuo ou em sacola de feira, é espelho de beleza. Essencialmente a do tipo indizível. Por enquanto é isso, por instinto, uma beleza que atrai, um prazer posterior.





quarta-feira, 21 de abril de 2010

Psiu!

Começo assim: do que falar iria, esqueci!

Entretanto...
Existe no pensamento alguma reminiscência sobre tradições poéticas, seus diálogos, sua conveniência... A beleza que os textos imemoriais seguram, às vezes, como enleios nas cabeças dos jovens poetas (you must sound like this to reach something...). Inegável que aquele toque de clareza profética nos textos 'clássicos' enchem nossa alma (a dos visados, viram?) de altura, de verdade, de armas. Sabemo-los certamente como fios condutores das unicidades humanas. Por isso são totêmicos. 

Venho a considerar os 'grandes' neste post, por necessidade em adequá-los como existentes, compositores e fundamentadores, não somente de minha poética, mas óbvio, de toda uma contemporaneidade. É que, ainda numa realidade de perspectivas mal equilibradas (aquelas do Deus é quem sabe), tomo a grande parte dos meus textos, frequentemente, não tanto em seu sentido, mas em sua possibilidade, clareza e dúvida. Estamos deparados com uma situação mezzo abandono mezzo insegurança... Venho aqui a considerar que alguém (quem sabe eu?) tem de se convencer de que o rapaz que aqui fala não é um amador, menos ainda um iniciante.

Who cares? A recepção comum (diria, corriqueira?) são críticos, estudiosos, curiosos, leitores, simpatizantes, paliativos... Eis que revelo: são pessoas! Tratariam um poema dum novo como encarariam um novo lançamento de celular. Será? No mínimo, em parte. Quase em essência. E todo um pretenso e fetal projeto em concepção poética para a fuga do comum mas com estada no essencial derrete na própria lama do qual surge. Aborto. É, é isso... Passo (passamos) pelo aborto. Fail!


Este blog testemunha um meandro ou outro disto. Puxa, que eu não precisaria falar disso. É que de todo silêncio vem uma pista, e toda pista implica numa busca e boa parte das buscas gravam quedas. Esta palavra e a que virá daqui a pouco e a que estaciona feito preposição ou pronome relativo são aquela ponte que nunca deseja cair. A que testemunha os quatrocentos anos de qualquer coisa (isso existe?). Este espaço é um poeta de camisa aberta!



"a cabeça cheia de ar que se desfaz no túmulo de Pound"

domingo, 11 de abril de 2010

frame

buttons not working 
are out of my vocabulary 
fixing all his smiling impressions 
surrendering my weak flesh that 
aches without a little point 
of his seedy light

quinta-feira, 8 de abril de 2010

LoveFail

Ofereço-me mais uma vez aqui a quem quiser me ferir. 

Passam por esta cabeça convenções lúcidas em cada erro que viver impõe. Tipo, uma nova paixão. Apêndice dessa condição de perda é parte dum poema de Monika Rinck, zum fernbleiben der umarmung, ou " de abster-se dos abraços", que li há poucos dias no blog Modo de Usar & Co., na tradução de Ricardo Domeneck. Sintam:



você não queria morrer uma vez mais,

despistar-se da colisão era sua única chance.


(...)


como amar certa linha de cabelo num crânio, um traço

de perfume no pescoço, tudo se foi, não ficou, longe.


(...)

Trago esses erros de uma viagem ao Recife - PE. Durante o trajeto, pelo ônibus, no que o Claro me permitiu deduzir, considerei várias impressões: paredões de rocha, morros, verde e barro indelével. A cor do barro é absolutamente tocante. Me calei para o barro. Na cidade de fato, durante a estada, (re)conheci um homem essencialmente este barro imóvel na estrada. 

De volta à minha São Luís, cheio de enleios, penso até agora em como pensar este homem num poema, já que pouco dele assumi e assimilei em minha corporalidade. Como paixão, não imagino aonde eu esteja. Então o que fazer? Me é especialmente permitido devanear na possibilidade de consumir essa verdade masculina na abstração. Entretanto isto não condiz com a realidade da matéria, notavelmente a humana, que grita como uma cigarra. Espero que vocês compreendam e considerem de alguma maneira essas indagações, não somente como um registro de um lovefail, mas na forma de mais uma maneira de amarmos a poesia. Em parte e sem compromisso, isso é o que imagino quando digo que 'quero pensá-lo num poema'. Num nível um tanto primário, mas faz parte. Outro parágrafo, por favor.

Venho pensando na religiosidade da poesia, no sentido do muitas vezes necessário desprendimento da materialidade, da vida frívola, da carne, enfim. Provavelmente por causa do arrebatamento, do mergulho inerente ao Orfismo. E na dificuldade de tomar aquele rapaz em meus braços como todo meu sistema pedia, acabo por dissolvê-lo num poema frio. De verdade, provavelmente, existem desvios em minha vida (vida de um poeta). Estamos cansados dos pássaros que escapam de nossas mãos, não?

De verdade, provavelmente, estruturalismos e críticismos à parte, nem sempre pensamos na molécula imensa e chorosa que é o humano por trás da poesia. Por trás da vida aparentemente silenciosa existem os poemas, que funcionam como olhos de um brilho considerado poesia. Aonde termina o ego do poeta e começa o ícone do artista, agora esculturado? Parece uma falha de cárater... Uma tristeza somente. My poetic illiteracy.
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