segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Dois poemas meus que foram publicados no Duelos Literários.

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MENOS QUE FRONTEIRA, PARTE DISTÂNCIA



erramos erramos e esquecemos este exato momento

sonhamos tramamos consideremos os travesseiros que assim sem ousadia não nos tenho

corpo sim porque não inventas algo para que paremos e reinvindiquemos aos sábios, momentos

em silêncio denuncio formas de amuleto formas de silêncio verdades no limite

da minha mão solta e suja
manufatura de fronteiras
eis que invoco aos deuses dum piano ou de um morro
que te esqueça no rio fronteiriço de
meus pés

me puxe que temos entre nós somente pêlos não cercas eletrificadas
me mostre além de meu país tuas tundras tuas vergonhas teus espelhos



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Recordações


talvez não me interesse lembrar de nada com essa conversa íntima e própria que tenho comigo assim na minha frente olhos nos olhos sem precisar justificar nada

como uma lembrança

a memória um dia falhará assim como é certo que alguns dias serão de choro mas não pondere esqueça esquecer faz parte da lógica do mercado e das belezas empacotadas e dos sonhos do começo do século não se perceba que isto implicaria numa lembrança morna anule-se para o espelho

talvez aí sobre vida

domingo, 24 de janeiro de 2010

Pelo dito hermetismo II ou Il faut être absolument moderne

Vai saber se é o calor ou a água que não chega, vai saber se não é nada, mas o fato é que não tenho pra onde correr, desviar, fugir. Acabo estando aqui gotejando alguma mensagem para o mundo depois de fuçar algumas Iluminações (Iluminuras não deixam de ser). Me sinto um pouco desarmado embora esteja cheio de consciência de que sou um bom trabalho ideológico-cultural, sei dos meus domínios. Amigos, Iluminações é robusto exemplar da dita poesia hermética. Com a visão num forame, auscultei, cotejei e considerei um mundo inteiro ao discernimento para poder carregar menos cansado as mãos de Rimbaud.

Perdendo o ar e a decência do raciocínio, li algumas peças deste livro famoso por, segundo alguns, ser a primeira reunião de poemas em prosa da literatura francesa, mas acredito que os e as rimbaudetes quiseram dar conta deste recado. Enfim, mastigado por algumas palavras, como primeira consideração teço que, antes fossem somente palavras ou que nunca sejam consideradas somente palavras; tentarei explanar sucintamente sobre a natureza das Iluminações: poemas em prosa sim, porque pouco se propõem a ser prosa poética; depois você tenta saborear suas origens e assiste a uma espécie de teopsia; após perder o ar, pois é amante da poesia, considerá-las numa sugestão onírica provavelmente será uma saída. É isso. Chegamos ao ponto, ponto de sonho. Do alto púlpito de minha arrogância, não creio que Rimbaud saboreasse todos seus possíveis problemas de maneira comum. Ele, seja ou lenda ou desejo de todo o século XX e XXI, era cheio da verdade de que seja um poeta. Vomitando isto e meu café da manhã simbolista/decadentista, parto a afirmar que sua coragem revolveu os padrões dos seres poemáticos e sua idiossincrassia real, arabescada, fru-fru. Tanto foi quanto é, que as Iluminações são inacessíveis em qualquer possibilidade de digeri-las se a recepção não guardar aquele pouco de compaixão às ideias juvenis e soltas, a saber, a linguagem não-padrão (social, ideológico, cultural, linguageiro, os cambau!) da expectativa.

Como estou só na sala vazia, ninguém ouviu meu risinho sarcástico. Talvez eu nem rido tenha. Mas é fato que  em minha imaginação de coragem e proporções provincianas, Rimbaud deitou algumas pedras de fonte numa questão que levanto a bons tempos, especialmente quando o tempo em questão é cento e dezenove anos depois do falecimento deste pétit roi: o discurso poético. Hei, espera aí, não é assim, discurso poético e pronto. Refiro-me à origem, à nascente, ao zigoto, talvez antes disso, à toda energia e massa e fisicidades necessárias ao surgimento indubitável e considerável de qualquer coisa que se mova ou não neste chão terráqueo ou em qualquer quintal jupiteriano ou extra-solar. O ponto zero do discurso poético. Donde surge, como grita, porque explode. Rimbaud espirrou novamente aqui este questionamento. Noutro post, citei Leminski que disse certa vez, algo como : "A poesia foi feita pras coisas sem porquê. Pra que porquê?". Imagino que um mundo rimbaudiano num mundo basilarmente positivista e recém-revolucionado industrialmente, numa proposta sincera de viver en rêve, óbvio que imbuído de postura e ousadia, Rimbaud escreveu o que não deveria ser mais ser retomado por outro artista, mesmo com a tradição de que Elliot falava, porque se trata de uma beleza única e desconhecida, deliciosamente obscura porque dificilmente dialogará com vozes e mentes hodiernas. A lírica rimbaudiana é cheia dele mesmo, e suas sibilas chegam a ser amor a nós, pobres partes unidimensionais.

Após este momento de pretensão, organizo melhor as ideias (ah, tá, até parece que sou capaz...) quanto a questão da compreensão das mentes hodiernas...Bem, nosso imaginário contemporâneo, digamos, local, pouco discute até que ponto expressionismos linguageiros, irracionalismos e enigmas prezam pela boa poesia. Particularmente até diria que, antes alguns borrões na consciência do que a rotina. Em suma, sugiro que a recepção é pouco especializada ou entregue às maneiras herméticas. Entretanto, aonde vão parar os pequeninos poetas que ousam, ou que simplesmente soam em sua linguagem sem correspondências à primeira vista? Apesar das voltas, tenho um parco recado a deixar dentro da gaveta: como em certa canção de Rufus Wainwright, release your love. Libertemos nosso destino miúdo da fome que é a rotina! Esparrememos o amor, a tristeza, a raiva, a loucura de cada texto, mesmo que ao nosso próprio modo, mas destaquemos uma oportunidade para os textos menos convencionais. Certo que inverdades e contradições surgirão, mas isto é esperado da maioria dos processos. O poema, o bom poema, é uma mobilização de um eu-lírico, mais ainda que somente sua pura atividade. Mesmo entre barreiras e concreto, há na particularidade, e neste caso, na extravagância, no egocêntrismo, na imparidade, no supostamente indivisível, uma relação potente com a realidade e seu mundo-palco. Lembrando Adorno, por carregar algo de não modificado, de não cutucado do ser humano, um subjetivismo num poema carrega uma conexão com o universal. Existem possíveis vidas e visões, entes e deuses na confabulação e doação que é o poema, transmutação do que no mundo recusou-se a se calar. Como os bebês que choram.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Pelo dito hermetismo

A saída mais especial ao discurso direto, isto é, o discurso previsível. Considerar podemos desta forma o que chamamos de enigmático, sibilino, obscuro, ininteligível. Aqui, no alto pedestal da ignorância, não conheço o cordeiro que tratou eruditamente das questões sobre o dito hermetismo. Aqui, no alto de meu pedestal de poeta perturbado, conheço e refaço comentários dos parcos leitores, entendamos, a recepção; e para a recepção aos Quatro Ventos dos Sete Oceanos, vos conforto: o que vosso carnal cérebro busca cristalizar é antes uma carniça ao faro do poeta: ser, em teoria, sempre aberto à caça do dia, da quinzena, dos trimestres. Novamente escancaro: o que parece incompreensível à primeira vista, não passa de uma parte no Universo que não conheceu vossa expectativa. A experiência particular do poeta, especialmente os pós-modernos em rotação, é um segredo informe à sociedade e ao mundo inteiro, fractal de uma atividade conjunta, quase comunitária de reflexos sobre a realidade e as baladas em Marte. Captam? Mais uma vez...

Senhores... Nesta vida, neste ambiente de recompensas e prazeres, a escritura ao poeta parece, de um lado ganhar força ao pensamento comum, com poesia de linguagem acessível e colorida, com vários sabores; por outro lado, existem escritores que se forçam a ser seu próprio poema, porque, como no primeiro caso, o discurso multimilenar dos homens não mais corresponde a qualquer que seja a busca ou o prazer. Entretanto, o prazer é o objeto magno da verdade. As pequenas satisfações na criação do texto que seja, é que parece (se não simula) suster a vontade por trás do parto inclusive dos textos considerados herméticos. O hermetismo, especificamente em poesia, não conforma a linguagem e a produção humana às esperanças de nossos bolsos e de nossos celulares com 3G, nossa competitividade, nem com a instrumentalidade (enfim!) inerente aos nossos fios de cabelo. Por que? Embora algumas mentes estejam ainda num século a mais ou a menos, o texto dito hermético precisa de uma leitura razoavelmente lenta e partida. Explico.

Para isto, retomo a afirmação primeiramente servida, de que o sibilino em um primeiro momento em poesia condiz com uma maneira de não se conformar com o discurso previsível da linguagem humana, e é mais isso do que simplesmente escrita automática ou rio. Não se propõe uma definitiva forma de palavrear a realidade, é somente uma nova maneira de viver essa realidade. Daí as digressões metalinguísticas e as fantasias temáticas; mas como tentava sugerir, a leitura desse modo diferente de escrever deve corresponder com seu sistema de expectativas. Se há desejo em desfrutar uma experiência linguageira destas, prepare-se para considerar a existência da palavra fora de seu comportamento necessário para os grandes temas da lira universal: amor, ódio, saudades, sexo, et coeteras voadores... Precisamos questionar, também fora de circuitos teóricos específicos, a razão e o contexto em que surge o discurso poético. Você espera o mesmo da poesia como linguagem da realidade para sempre? Eu não. 

domingo, 3 de janeiro de 2010

É como se eu estivesse do lado de fora...


...esperando minha conhecida auto-piedade, porém desta vez ela não está aqui e parece que nada sobra. Tem de ser dito algo enquanto não há descanso. Esqueço dos homens, dos livros, dos loucos: perdura agora a reflexão perdida.

Enquanto todos gritam, me escondo num travesseiro de pedras; aqui há festa, dentro aqui hão lesmas... Esperar o que? Eu mesmo desejo não esperar nem eu mesmo. Sabemos, pois, que expectativa pode não ser esperança, então agarremo-nos nesta! Lembrando que esperança é fé, e fé é conforto, agora há o que lembrar de mim aqui fora.

Enquanto há festa, me desvio de tantos corpos e entendo o porque de tantos entorpecimentos; é que o pão a comprar, o trabalho que se hospeda e a obrigação das ruas não te permitem sonhar... Sonhar! Agora com uma dose de ideologia, há o que lembrar aqui fora, há um motivo para morrer em paz.

Amanhã é uma segunda-feira com vocação para a chuva, chuva nas ruas, chuva aqui dentro. Amanhã me fecho e sei que algo será esperado. Eu o gesto, o conformo, o destilo. Que me livrem de mim mesmo no que falo, continuo a descobrir alegrias esporádicas apesar de todos dos apesares...e não consigo ensinar ou mostrar nada a ninguém; mais um motivo para lembrar de mim aqui fora, para morrer em paz, para esquecer de morrer.



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